Tradições | 01-12-2023 21:20

Serranos, Campinos e Bairrões - Locais e Ambientes - A Azeitonada

Serranos, Campinos e Bairrões - Locais e Ambientes - A Azeitonada

Uma das grandes riquezas do Ribatejo é o azeite de oliveira, esse líquido precioso, que nenhum outro o paladar nacional tolera.

Locais e Ambientes - A Azeitonada1

Uma das grandes riquezas do Ribatejo é o azeite de oliveira, esse líquido precioso, que nenhum outro o paladar nacional tolera.

Creio que a única operação agrícola para que a indústria dos sábios ainda não descobriu máquina, é a apanha da azeitona. Toda ela tem de ser repinhada ou ripada e varejada para cima de panos ou para o terreno, donde depois é apanhada, bago a bago, coisa que nem toda a gente sabe fazer; mas há regiões, onde há varejadores e apanhadeiras de fama.

É para aí que os lavradores escrevem a qualquer capataz conhecido, e, na época indicada, ele aparece na herdade, na quinta, ou na propriedade, à frente do rancho, geralmente duas apanhadeiras por cada varejador. Justam-se a tanto por dia, casa para quartel e as necessárias comedias, ou comedorias. E começa-se logo ali a marcar a ordem do trabalho. Os homens, de vara em punho e barrete no ombro, esperam ordens do capataz. Distribui-se-lhe o primeiro copo de água

pé, agradecido com alguns vivas ao patrão e mais à bela sucidade.

No dia seguinte lá vão a caminho do olival, mal luz o buraco. Os homens de vara às costas e as mulheres de cesta no braço, guiados todos pelo som atroador e monótono do búzio, clarim clássico e indispensável para fazer marchar esta tropa. À noite voltam, guiados pelo mesmo instrumento, a tomar a sua ceia, quentinha, que consta invariavelmente de hortaliça com feijão, fartamente azeitada. Depois baile até lá para as 10 ou 11 horas: mas com uns copitos dados a tempo, e com método, o capataz condescende em que ele se prolongue até à meia-noite. E todos os dias os mesmos, e todas as noites as mesmas!

Mas um dia acabou-se a azeitonada e o rancho chega do olival mais cedo, não somente acompanhado do búzio, mas de harmónio, guitarra, ferrinhos, ou na sua falta, dois garfos enfiados no gargalo de uma garrafa, um cântaro a servir de bombo, e lá vem aquele cortejo até à residência do patrão que, sorridente e feliz, lhes tem preparada a comezaina da adiafa, banquete de truz coroado por alguidaradas de fritos que é um louvar a Deus!

Por fim, como não podia deixar de ser em terra portuguesa, há discurso, em que o capataz, bastante pingaxado, e limpando a boca às costas da mão, se despede do patrão, da senhora patroa e de todos os patrões e “-Deus queira que p´ró ano aqui estêjamos todos outra vez, p´ra termos outra adiafa coma esta”, etc.

O patrão faz-lhes contas, desarma-se a bandeira, que traziam enfeitada com toalhas bordadas e cordões de oiro e lá voltam à sua terra, contentes e felizes, podendo-se dizer deles muitas vezes o mesmo que os taralhões diziam às andorinhas…

1 Escrito por Francisco Serra Frazão e publicado no Primeiro de Janeiro em janeiro de 1941

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