uma parceria com o Jornal Expresso

Edição Diária >

Edição Semanal >

Assine O Mirante e receba o jornal em casa
31 anos do jornal o Mirante

Uma profissão dourada

Isabel Bento é empregada de ourivesaria há 20 anos

Isabel Bento tem aquilo que se chama de profissão reluzente. Todos os dias passa horas a mexer em metais preciosos como o ouro ou a prata, mostrando a potenciais clientes algumas das peças que gostaria ela própria de possuir.

Metade da vida de Isabel Bento, de 44 anos de idade, foi passada por detrás do balcão da ourivesaria do seu irmão, na zona histórica de Tomar. É ali, entre a prata, o ouro e os relógios que vão batendo as horas, que a residente em Beselga de Cima (concelho de Torres Novas) se sente bem.Há peças que Isabel gosta tanto que acaba por pôr de parte assim que chegam à loja. “Mas só aquelas que me dizem algo e claro, também depende do preço”, refere.Apesar de a vida não estar para grandes investimentos, ainda há quem gaste bom dinheiro em ouro. Na semana passada, por exemplo, Isabel vendeu uma medalha em ouro antigo por mais de 400 euros.Era bom que todos os dias fossem como aquele mas a verdade é que na ourivesaria onde Isabel trabalha a procura tem vindo a diminuir. E nem no Natal as coisas melhoram. “Antigamente, sim, vendia-se muito nesta época do ano, agora quase não se nota diferenças”.Não se pode chegar aos preços do ouro, compra-se acessórios em prata. Os ourives têm vindo nos últimos anos a apostar na feitura de peças deste material, dando-lhes formas exóticas e originais, atractivas para os clientes mais jovens.“São peças vistosas, anéis com pedras grandes, colares e gargantilhas de formas pouco vulgares, produtos que atraem muito os jovens”, refere, adiantando que hoje em dia o que está na moda é ser extravagante.Há clientes e clientes. Os que Isabel menos gosta são os indecisos, aqueles que passam horas dentro da loja, pedem para ver tudo e depois acabam por não levar nada. Mas também já atendeu clientes que se despacham em cinco minutos – “são aqueles que sabem exactamente o que querem. Olham a montra, entram e compram”.Os homens são sempre mais pragmáticos. A única dúvida que os costumam assaltar na altura da escolha de um anel, por exemplo, é o tamanho. Mas como sempre o podem trocar, caso não sirva, acabam por decidir-se rapidamente.O pior são as senhoras, muito mais indecisas. Escolhem logo uma série deles, depois experimentam-nos todos e a seguir vêm as dúvidas – “levo este ou aquele”.Se antes era na época natalícia que mais se vendia, agora é o Verão a ditar as compras. É a altura geralmente mais escolhida para casamentos e baptizados e muita gente continua a preferir dar uma prenda em ouro ou prata a qualquer outro presente.Mas há dias em que não se faz uma venda. “As pessoas que passam na rua e olham para a ourivesaria vêem lá sempre gente mas a verdade é que a grande maioria vai apenas trocar cartões ou pagar a semanada”.Os cartões é um trunfo arranjado por algumas ourivesarias para fidelizar clientes. “Cada cartão custa nove euros, dá para 20 semanas e fica automaticamente pago se o número do cartão que o cliente possuir for idêntico aos dois últimos números da lotaria semanal”.Apesar de não dar grande lucro à ourivesaria, a verdade é que muitos clientes acabam por aderir ao cartão e a pouco e pouco vão comprando peças que de outro modo não comprariam.Uma coisa é certa – ninguém hoje em dia compra ouro para guardar, como investimento. “Antigamente é que as pessoas faziam pequenas fortunas em peças de ouro. Agora quem compra é para usar no dia a dia, mesmo as peças mais caras”.Apesar de trabalhar ali há duas décadas, Isabel diz que ainda há clientes que a conseguem surpreender pela negativa. A empregada de ourivesaria tem uma deficiência física de nascença, o braço direito mais curto, e nunca conseguiu ultrapassar de todo o problema.Talvez porque há quem nunca a deixe esquecer. A situação que mais a enervou aconteceu há uns anos, tinha a Isabel a casa cheia. Quando se abeirou de uma idosa a perguntando-lhe o que pretendia a senhora reparou no seu braço direito e exclamou alto e bom som – “ a senhora é aleijada”.Isabel tentou manter a calma e voltou a perguntar-lhe o que desejava. Mas a cliente continuava a dizer a quem quisesse ouvir que ela era uma aleijada, deixando até os outros clientes constrangidos. “Às vezes as pessoas não têm sequer noção do efeito que as suas palavras provocam”, condescende a empregada de ourivesaria.Quando não está de volta do ouro e da prata, Isabel tem dois grandes passatempos – a leitura e o coleccionismo. “Gosto muito de ler, qualquer tipo de livros”, diz, adiantando que às vezes chega a ficar vários minutos parada em frente da montra de uma livraria, apenas para ler os títulos dos livros. “Se algum me agradar, entro e acabo por comprar”.Deve ser das poucas pessoas que consegue ler enquanto vê televisão. “Ainda este fim de semana estava a dar um programa que me interessava mas também estava embrenhada na leitura. Por isso ia lendo e assistindo ao programa”.As borboletas são seres que a fascinam pelas formas e pelas cores exóticas das suas asas. Por isso faz colecção destes insectos e até tem um embalsamado.O seu sobrinho, ourives de profissão, já lhe fez propositadamente uma borboleta em ouro para pôr na lapela do casaco e um anel de prata em forma de borboleta. Margarida Cabeleira

Mais Notícias

    A carregar...