Opinião | 06-05-2024 18:19

Debaixo D’Água (Segunda Parte) - Uma Tragédia Evitável

Debaixo D’Água (Segunda Parte) - Uma Tragédia Evitável
foto DR Fernando Oliveira - METSUL

Porto Alegre não tem sido contemplada com bons gestores nos últimos 20 anos, todos eles, começando com o ex-professor de Português, José Fogaça, o seu vice, José Fortunati, que assumiu para Fogaça concorrer ao governo do estado e se reelegeu, passando por Nelson Marchezan Jr e, agora, o indefectível Sebastião Melo, um populista com cara de povo e ações neoliberais, todos eles governam ou governaram a cidade somente para os que se julgam os donos dela.

Depois da enchente de 1941 -em Porto Alegre e nos vales mais próximos- um sistema de evitação de enchentes foi construído. A pleno ele poderia suportar até 6 metros, o que seria suficiente para manter as inúmeras cidades situadas nestas regiões seguras diante do paroxismo hídrico. As cheias de 1941 atingiram 4,76 e a atual ultrapassou os cinco metros, havendo ambiguidades na definição do máximo atingido nessa cheia, mas se supõe que tenha sido em torno dos 5 metros e 33 centímetros. O retorno das águas dos rios e dos lagos aos leitos deverá demorar muito mais do que antes, porque com o aquecimento global houve uma elevação gradual das águas e o desaparecimento de praias inteiras pelo avanço dos oceanos. As ações humanas estão impactando, demasiadamente, o planeta nos últimos cem anos e a conta está vindo mais rápido do que imaginavam os ferrenhos desenvolvimentistas, que são partidários de um modelo que está destruindo o planeta.

Carlos Todeschini, ex-diretor do DMAE-Departamento Municipal de Águas e Esgotos, explica em uma entrevista que a falta de manutenção no sistema é responsável pela facilidade com que as águas romperam as proteções construídas. Como todo sistema, o de proteção contra as cheias de Porto Alegre, depende de cada parte para que funcione plenamente, caso contrário, surge o efeito disfuncional em cascata e o resultado é o colapso completo. Todeschini detalhou o funcionamento do sistema que é composto de (:) diques, bombas d’água, comportas de superfície e submersas, além de condutos. O Muro da Mauá, completado em 1974, é apenas a ponta do complexo mecanismo que compõe o sistema de proteção. As dificuldades, pela defasagem e falta de manutenção dos sistema, já ficaram evidentes na enchente anterior, que atingiu 3,46 m. Na época, problemas como a devolução das águas pelas bocas de lobo e bueiros, confirmavam que as comportas de gravidade falharam, ou seja, completa Todeschini; “é o retorno da casa de bombas”.

O atual prefeito tem se destacado pelo apoio total a novas obras das grandes construtoras, o seu projeto é um tipo de desenvolvimento que vê o regramento de proteção ao meio ambiente como um empecilho burocrático para o crescimento da cidade, sem levar em conta o equilíbrio e os sistemas de esgotos que estão enterrados sob a terra e totalmente defasados. Basta haver chuvas mais intensas para que os alagamentos se repitam nos mesmos locais. O corte das árvores no Parque Harmonia, cerca de 435 de um total de 1300, além de machucar várias árvores que não foram derrubadas, corrobora o projeto neoliberal do alcaide. Porto Alegre não tem sido contemplada com bons gestores nos últimos 20 anos, todos eles, começando com o ex-professor de Português, José Fogaça, o seu vice, José Fortunati, que assumiu para Fogaça concorrer ao governo do estado e se reelegeu, passando por Nelson Marchezan Jr e, agora, o indefectível Sebastião Melo, um populista com cara de povo e ações neoliberais, todos eles governam ou governaram a cidade somente para os que se julgam os donos dela.

Existe um vídeo que é emblemático: no dia 2 de maio do ano passado, quando a prefeitura tentou fechar uma das comportas com uma retroescavadeira, um processo que deveria ser simples se as engrenagens estivessem atualizadas e funcionais. Desta feita 4 comportas precisaram de auxílio mecânico para serem fechadas, o que apenas confirma a incompetência e o desinteresse pela Coisa Pública. O DMAE, através dos seus responsáveis, relatou que havia motores, mas que foram levados por ladrões. Funcionários do respectivo departamento ainda tiveram que soldar os trilhos que estavam avariados, o que não falta são exemplos da má atuação dos gestores do estado e do município. As 14 comportas, para serem fechadas corretamente, devem correr nos trilhos até o fechamento, se colocar as borrachas nas laterais e, por baixo das comportas, os parafusos de pressão, explicou o ex-diretor do DEP- Departamento de Esgotos Pluviais, Augusto Damiani. É mister entender que existe um projeto dessa franja de políticos para o esgotamento e o estresse do Setor Público, com isso entidades que já prestaram ótimos serviços à população estão sendo sucateadas para justificar o seu desaparecimento e a sua substituição completa pelo Setor Privado.

O prenúncio de uma tragédia que pode ceifar vidas humanas e de animais, que devora plantações e traz consequências horríveis para a sobrevivência de muitos, não se pode medir por nenhum valor e não deve ser subestimado por nenhum gestor de cidades, estados ou países. Porém, o que se percebe, muitas vezes, é o contrário, muitos desses gestores parecem preocupados com outras coisas e tem interesses diversos daqueles que buscam o bem comum. A população não pode mais se permitir escolher tão mal os que lhe representam e dirigem a vida coletiva dos entes federativos. A única solução é estreitar a relação com os eleitos para que sejam colocados em seu devido lugar, o de servidores e não o de aproveitadores. Não há mais espaço para a alienação na escolha política, é preciso ir além do voto para que a democracia não seja destruída de fora para dentro. Porto Alegre está vivendo o seu pior pesadelo, mas se continuar assim não será o último.

Vinicius Todeschini 07-05-2024

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